Centro de Arte Popular expõe ‘Antes de mim, falaram meus ancestrais’
Reunindo 33 obras inéditas de seis artistas mineiros, a exposição fica em cartaz até o próximo dia 29 de junho, com visitação gratuita
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As folhas secas espalhadas pelo chão do Centro de Arte Popular não são um mero detalhe decorativo. Elas recriam a atmosfera da floresta, evocando a presença ancestral e a conexão espiritual dos povos indígenas com a natureza. Resumem, assim, a ideia central da mostra “Antes de mim, falaram os meus ancestrais”, em cartaz até 29 de junho.
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A exposição reúne 33 obras inéditas de seis artistas mineiros – Cacique Paulino Aranã, João Aranã Moreira Índio (João Índio), Márcia Martins, Marlene Aranã, Mônica Mendes e Tânia Caçador – sob curadoria da manauara Orange Matos Feitosa, que também assina a expografia.
No ponto central da exposição, o visitante se depara com uma gaiola do tamanho de uma pessoa, cercada por lanças indígenas, confinando um coração gigante. “A primeira associação que se faz é com algum conflito armado, porque a lança é vista como arma, né? Mas, no contexto da mostra, ela representa um ritual. É como se aquele coração estivesse envolvendo aquelas lanças”, explica Orange.
Releitura de foto
A obra, criada por Márcia Martins em conjunto com João Índio, é o elo central da exposição, conectando os eixos temáticos: antropofagia, grafismo corporal, cosmovisão e a intensidade lírica dos pássaros.
Logo atrás, destaca-se a releitura da icônica foto “Menina afegã”, de Steve McCurry, que estampou a capa da revista “National Geographic” em 1985 e se tornou símbolo dos refugiados afegãos. A versão criada por Mônica Mendes, feita em tinta, mantém a mesma intensidade lírica, mas adapta os traços para lembrar os povos indígenas brasileiros, destacando sua resistência e força.
Tal figura simboliza comunidades constantemente subjugadas e violentadas, vítimas de invasões de terras, avanço do garimpo ilegal, racismo estrutural, falta de o à saúde, educação e segurança alimentar. E, ao mesmo tempo, evoca a ideia de resiliência, “que é diferente da ideia de resistência”, afirma Orange.
“A resiliência vai além. Incentiva e anima as pessoas a criarem um novo mundo, caso este nosso não dê certo”, diz a curadora.
As demais obras nasceram de um curso ministrado por Orange em 2023 a respeito do olhar colonizador sobre os povos indígenas. As alunas Márcia Martins, Mônica Mendes e Tânia Caçador – que não são indígenas – buscaram ouvir relatos de representantes do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, que engloba as etnias Aranã, Maxakali, Kamakã, Tupinambá, Kariri-Sapuyá e Gueren. Durante o processo, conheceram Cacique Paulino Aranã, João Índio e Marlene Aranã, e aram a produzir juntos.
“A gente tem uma visão muito deturpada dos povos originários, aquela ideia de que são pessoas atrasadas ou que não podem ser consideradas indígenas porque estão em conexão com o mundo atual”, diz Orange. “E não é nada disso. Eles têm a cosmovisão deles, que vai muito além de uma simples perspectiva. Ela envolve uma forma de viver e de se relacionar com tudo ao redor. É o que estamos mostrando aqui.”