
O vaivém caótico e frenético da Avenida Afonso Pena, no coração de Belo Horizonte, Região Centro-Sul da capital mineira, esconde uma horta centenária, que desafia a agem do tempo e relembra a tradição interiorana dos pomares nos quintais. Esse oásis, que a despercebido em meio ao mar de concreto, onde imperam edifícios do entorno, como o imponente Acaiaca, conta com mais de 20 variedades de frutas e hortaliças – entre elas, três mangueiras de cerca de 15 metros – tudo cultivado com muito carinho e dedicação no jardim da Paróquia São José.
O olhar atento e o trabalho diário do padre Flávio Campos, que cuida da horta desde que chegou à paróquia, há 8 anos, vem gerando frutos doces e suculentos para a alimentação dos religiosos que vivem no Convento São José. “Tem jabuticabeira, pitangueira, bananeira, resquício do ado, quando toda casa tinha um quintal, uma horta de subsistência. Mantemos aqui o costume de cultivar frutas e verduras para consumo próprio”, explicou o padre, destacando que, há três semanas, vem comendo as bananas do pomar da paróquia, localizada a poucos metros da Praça Sete.
Visitantes ilustres do local, pardais e bem-te-vis se alimentam dos frutos e, como agradecimento, cantam pelos jardins, em contraste com as buzinas do trânsito. Segundo o pároco, além de chamar a atenção dos pássaros, a horta desperta a curiosidade de fiéis e de vizinhos de um prédio em frente, que costumam contemplar, pela janela, a exuberância da natureza que brota ali. Ele conta, ainda, que o irmão Pedro, também responsável pelos cuidados com a horta, costuma doar mudas para a comunidade.
Quando perguntado sobre a variedade de produtos cultivados, o religioso, que nunca havia contabilizado as espécies, listou uma série de alimentos; alface, rúcula, almeirão, agrião, salsa, cebolinha, hortelã, manjericão, alecrim, coentro, feijão, jabuticaba, banana, mamão, goiaba, acerola, pitanga, manga e uma fruta exótica brasileira, nativa da Amazônia, chamada abiu, que, segundo ele, tem uma viscosidade na casca que incomoda quem não sabe como comê-la.

Quarentena 5i1f10
Antes de se mudar para o convento, padre Flávio conta que nunca havia cultivado uma horta, mas tomou gosto pela coisa, e durante a quarentena, com a maior disponibilidade de tempo, tem dado ainda mais atenção aos pomares. “É quase uma terapia ocupacional. Ajuda a ar o tempo. Parece um sítio, uma pequena chácara no Centro de Belo Horizonte, onde temos à disposição produtos fresquinhos e saudáveis. A horta é orgânica, a gente não usa agrotóxicos, as folhas são sempre mais verdinhas e crocantes”.
Para o pároco, o segredo de tanta fartura está no trabalho diário. “Eu acho que é como o ditado, o olho do dono que engorda o gado. Todos os dias eu vou lá, pelo menos para ver se tem formiga, se tá bem molhado. O olhar é fundamental”, destacou. *Estagiária sob a supervisão de Enio Greco