LUTA

Mulher negra que teve autodeclaração racial invalidada recorre à Justiça

Bárbara Furtado teve o às vagas reservadas a cotas raciais negado por comissão do Concurso Nacional Unificado

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O ativismo antirracista sempre esteve presente na vida da farmacêutica Bárbara Furtado, de 46 anos. Como inúmeros outros brasileiros, ela nasceu em uma família interracial, mas se considera negra e com muito orgulho.

Recentemente, teve que levar o tema da igualdade à Justiça após ter a autodeclaração racial invalidada pela Comissão de Heteroidentificação do Concurso Público Nacional Unificado (CNU), enquanto disputava uma vaga no Bloco 5, relativa a cargos de Educação, Saúde, Desenvolvimento Social e Direitos Humanos. 

Além de ter se sentido injustiçada em relação ao concurso, Furtado conta que a invalidação atenta contra toda a trajetória dela, que está intrinsecamente relacionada à autoidentificação com a ancestralidade negra. “Eu questiono minha racialidade desde quando era criança”, explica a farmacêutica, que vem de uma família interracial. 

Para ela, o gatilho que acabou levando a questão racial definitivamente para a carreira profissional foi o primeiro concurso no qual disputou uma vaga reservada a candidatos negros. “Demorei uns três meses refletindo para entender se eu tinha direito às cotas ou não, porque, na época, eu alisava o meu cabelo”, lembra. “Eu ficava questionando se sofria racismo ou não por causa do meu cabelo alisado e daí começou meu processo de conscientização racial”, prossegue. Ela, inclusive, foi aprovada naquele processo de seleção, mas acabou não assumindo a vaga.

Desse gatilho veio, definitivamente, uma nova maneira de enxergar a si mesma e o mundo. “Eu era não só uma pessoa que atuava na saúde, mas também uma ativista de direitos humanos, principalmente com a questão da racialidade do gênero, defendendo a saúde da mulher negra no Brasil, e eu vi várias atrocidades”, lembra a farmacêutica.

Dessas experiências veio a decisão de estudar o tema da racialidade, primeiramente na especialização em Saúde Pública e, mais recentemente, na tese de doutorado, concluída em 2024. 

Oportunidade após episódio de racismo

Em janeiro do ano ado, quando soube do CNU, viu uma boa oportunidade se abrir e rapidamente começou a estudar. Para a farmacêutica, era o momento ideal para ingressar em uma nova fase, já que ela havia acabado de ar por um grande constrangimento profissional.

“Uma pessoa me acusou de ter roubado cinco mil máscaras no hospital em que eu trabalhava. Ela fez essa acusação sem nenhum pudor, sem nenhuma prova, demonstrando um crime racista”, diz Furtado. Apesar de, posteriormente, ter ficado esclarecido que ela não era a responsável pelo sumiço dos materiais, a acusação deixou marcas. “Arrasou com minha vida. Eu fiquei muito doente nos últimos anos”, lamenta.



Porém, em menos de dois minutos, os examinadores do CNU invalidaram as origens, a história de vida e os sonhos de Furtado, que se sentiu surpresa e indignada com a invalidação da autodeclaração racial. “Quando fiquei sabendo do resultado, não enquadrado, custei para entender o que que significava aquilo. Que resposta é essa? Não consegui entender, eu realmente não consegui entender". Mas, na hora que caiu a ficha, que eles estavam falando que eu não era uma pessoa negra, eu pensei: que absurdo”, desabafa.

Justiça

Sem outra alternativa, a farmacêutica recorreu à justiça. A defesa dela questiona a decisão com base não apenas nas características fenotípicas, já que Furtado, que tem cabelos crespos, nariz de base larga com narinas amplas e ponta arredondada, lábios grossos e testa alta e reta, como também na trajetória de vida dela, que inclui, inclusive, episódios de racismo. “O fato de eu ser uma mulher negra, de pele clara, me coloca numa situação que muitas pessoas leem como privilégio, mas na verdade muitas vezes eu sou alvo”, avalia.

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"Eu não posso aceitar esse resultado: não é só uma questão do concurso em si, é honra; é uma questão da minha vida. Eu não vou itir lógicas coloristas racistas que desagregam pretos e pardos para desqualificar políticas de reparação histórica para pessoas negras”, explica a farmacêutica. “É toda uma luta histórica que a gente vem tentando para poder garantir mais oportunidades para pessoas negras, então, eu vejo que isso é um grande desserviço”, conclui.

A ação surtiu efeito: uma decisão do Tribunal Regional Federal da 1º Região determinou que a Cesgranrio, responsável pela execução do concurso, submeta Furtado a uma nova banca de heteroidentificação, que deve seguir os mesmos parâmetros preconizados pelo edital. “Eu espero que esse erro seja corrigido, que eu consiga entrar de novo no certame e que minha posição seja respeitada, porque, apesar de todos os pesares, eu fui muito bem nas provas objetivas e fui super bem na prova de títulos”, sintetiza a farmacêutica, esperançosa tanto em um novo capítulo para a trajetória profissional quanto em uma decisão justa.

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