MG: megaempresário do agro, réu por morte de piloto, assina acordo; entenda
Inácio Carlos Urban responde a processo criminal após contratar mecânico sem habilitação da Anac para dar manutenção em aeronave que caiu em Coromandel
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Siga noO megaempresário Inácio Carlos Urban — réu por homicídio culposo (sem intenção de matar) em razão da morte do piloto de avião Rodrigo Carlos Pereira, aos 39 anos, em Coromandel, no Alto Paranaíba, em Minas Gerais — realizou um acordo com a Justiça do Trabalho, que foi homologado nesta sexta-feira (25/4). Com isso, o fazendeiro e o Grupo Farroupilha — conglomerado presidido por Inácio e ligado ao agronegócio com sede em Patos de Minas — assumiram uma série de obrigações para que sejam evitados acidentes de trabalho no setor de aviação.
Como mostrou o Estado de Minas em novembro ado, o Ministério Público do Trabalho (MPT) já havia obtido na Justiça uma tutela de urgência com essa finalidade. Na ocasião, a decisão aconteceu após a defesa do Grupo Farroupilha se negar a um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) no qual se comprometeria a cumprir em todas as empresas do conglomerado a legislação trabalhista — que foi negligenciada na relação de trabalho com Rodrigo Carlos Pereira, morto após a aeronave em que estava cair em uma das fazendas de Inácio, em Coromandel, em 2020.
O avião, um modelo EMB 202A da Embraer, de propriedade do fazendeiro, possuía defeitos crônicos e havia recebido manutenção de um mecânico inabilitado minutos antes da queda. Esse profissional também acabou se tornando réu por homicídio culposo.
Agora, com o acordo firmado, Inácio e seu grupo econômico se comprometem a dar manutenção adequada nas máquinas e nos equipamentos em periodicidade determinada pelo fabricante, por profissional legalmente habilitado e em conformidade com as normas técnicas aplicáveis. Também está entre as obrigações pactuadas o adequado registro de anotações dos serviços realizados.
Doação de R$ 400 mil
O grupo econômico deve ainda fazer uma doação de R$ 400 mil a fundos públicos de interesse da comunidade de Patos de Minas ou a outros fundos, instituições ou órgãos públicos indicados pelo MPT. O valor será revertido para órgãos públicos e projetos sociais locais no futuro. O acordo judicial prevê multa de R$ 20 mil por cada obrigação não acatada. O montante salta para R$ 100 mil caso não seja possível confirmar o número de descumprimentos.
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“A fiscalização do cumprimento das obrigações definidas no acordo em questão será feita por meio de relatórios semestrais, pelos próximos dois anos, os quais devem ser assinados por engenheiro do trabalho (com anotação de responsabilidade técnica) e encaminhados pelo Grupo Farroupilha. Eles devem contemplar diversas informações, inclusive diários de bordo dos pilotos que registrem eventuais panes durante os voos. Por fim, o grupo deve manter, permanentemente, uma cópia desse acordo no livro de inspeção do trabalho”, explicou o MPT.
O Estado de Minas entrou em contato com o Grupo Farroupilha e aguarda retorno. A defesa do empresário e a assessoria do conglomerado, no entanto, não têm respondido à reportagem em outras publicações, como, por exemplo, na ocasião em que a Justiça tornou Inácio réu.
Rodrigo Carlos Pereira ao lado da esposa, Patrícia Cristina da Silva Pereira, e dos filhos, que, à época do acidente, tinham 3 e 5 anos
Relembre o caso
Visando à pulverização de agrotóxicos, o então funcionário de Inácio Carlos Urban decolou com uma aeronave em 7 de fevereiro de 2020 do aeródromo de Coromandel. O avião caiu na cabeceira da pista de pouso da Fazenda São Francisco, perto de uma lavoura de milho, dez minutos após a decolagem.
O acidente ocorreu no primeiro voo após os reparos realizados por Rogério Dalla, mecânico contratado por Inácio, que não possuía a habilitação necessária na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). A Polícia Civil encerrou o inquérito em 12 de abril do ano ado e o enviou ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), com os indiciamentos de Inácio e Dalla, depois da conclusão da investigação. Na oportunidade, o delegado Leandro Fernandes Araújo apontou que a aeronave pilotada por Rodrigo apresentava defeitos “gravíssimos”, como superaquecimento, vazamento de óleo do motor, corte de combustível e panes elétrica e termostática.
O empresário e o mecânico tornaram-se réus por homicídio culposo em 31 de outubro de 2024, quando a Justiça acatou a denúncia do MPMG. Em caso de condenação, a pena varia de um a três anos de detenção. No entanto, o promotor Edon Rodarte havia solicitado no documento encaminhado à Justiça que Inácio e Dalla fossem condenados com aumento de um terço na pena, conforme prevê o Código Penal em casos de “inobservância de regra técnica de profissão”.
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Segundo a promotoria, o mecânico possuía formação que não o habilitava a realizar intervenções em tais equipamentos, apenas a prestar consultoria em manutenção de aeronaves. “Além da ausência de qualificação e habilitação técnica, foi apurado que os reparos da aeronave eram realizados em locais improvisados e que as peças utilizadas eram inadequadas”, afirmou Rodarte na ocasião, acrescentando que Rogério foi o “autor” do crime de homicídio culposo e Inácio “participou culposamente do delito”, pois foi omisso “por inércia própria”, já que era responsável por garantir condições seguras de trabalho em sua propriedade.
Quem é Inácio Carlos Urban?
Dono de mais de 20 mil hectares de terras e diversas fazendas em Minas Gerais, Inácio Carlos Urban é natural da cidade de Não-Me-Toque, no Rio Grande do Sul. Os pais dele, descendentes de alemães, eram pequenos produtores rurais. Seguindo a tradição familiar, o Grupo Farroupilha, com sede em Patos de Minas, começou a tomar forma em 1976.
Oito anos depois, em 1984, o empresário comprou em Coromandel a Fazenda Rio Brilhante, com área de produção situada em altitude média de 1.150 metros. Somente o nome Rio Brilhante — que se tornou uma das cinco patentes registradas em marcas de café — chega hoje a mais de 30 países, segundo o grupo.
De modo geral, o conglomerado executa também atividades de produção, industrialização e comercialização de outros produtos agrícolas, como milho, soja, feijão, trigo e algodão, empregando mais de 600 pessoas por ano. O quantitativo, no entanto, a de 1.000 colaboradores diretos nos períodos de safra. O grupo explora ainda a pecuária de corte, além de contar com um laboratório para produção e análise de sementes.