Após veto da UFMG, aluno que se autodeclarou pardo tem matrícula deferida
O candidato, aprovado em medicina na UFMG, precisou entrar com ação judicial para suspender o parecer da comissão de heteroidentificação
compartilhe
Siga noUm candidato que se autodeclarou pardo no processo seletivo do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) para este ano teve sua avaliação negada pela comissão de heteroidentificação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ele foi aprovado no curso de medicina, mas só teve a matrícula aceita na modalidade de reserva de vagas para cor/raça (PPI), após acionar a Justiça, que suspendeu o parecer da comissão. A decisão foi dada pelo juiz federal Rodrigo Pessoa Pereira da Silva, da 3º Vara Cível Federal de Belo Horizonte, no dia 20 de março.
No processo de heteroidentificação - responsável por evitar a ocorrência de fraudes na política pública de reserva de vagas às cotas raciais -, a banca indeferiu o registro da matrícula com base no procedimento realizado por meio do edital para o aos cursos presenciais de graduação da UFMG, pelos candidatos selecionados por meio do Sisu.
A ação, portanto, foi embasada em dois aspectos apresentados pelo estudante: uma série de fotografias feitas em vários momentos de sua vida e laudo dermatológico que o inseriu no Nível IV da Escala de Fitzpatrick. A classificação internacional, é reconhecida pela Sociedade Brasileira de Dermatologia e é também a única prova científica aceita pelos tribunais brasileiros em ações envolvendo cotas raciais.
Leia Mais
Além disso, a Lei nº 12.711, de 2012, que dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio, estabelece que devem ser reservadas, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo, 50% das vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.
Ainda em conformidade com a legislação, as vagas devem ser preenchidas por autodeclarados pretos, pardos, indígenas e quilombolas e por pessoas com deficiência, na mesma proporção das respectivas etnias da unidade da Federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Parecer da Justiça
O juiz Rodrigo Pessoa avaliou que "o candidato, tratando-se de pessoa mestiça, possui características fisionômicas que o aproximam mais do perfil racial pardo, em especial quanto à tonalidade da pele”.
O magistrado observou também que, quando se trata de determinar os destinatários das políticas de ações afirmativas, “tanto a autoidentificação, quanto a heteroidentificação, ou ambos, são plenamente aceitáveis do ponto de vista constitucional”.
O advogado responsável pela ação, Israel Mattozo, comentou a decisão judicial. "Se a autodeclaração não é suficiente, o mínimo que se espera é que seja respeitado o direito à ampla defesa e ao contraditório dos candidatos”, disse o também especialista em direito istrativo.
Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia
UFMG
Em nota, a UFMG esclareceu como funcionam as bancas de heteroidentificação. Leia abaixo o comunicado na íntegra.
"Foram instauradas na UFMG em 2019, com a finalidade de fazer uma leitura social das características fenotípicas dos candidatos. Esses traços são os aspectos físicos do corpo, como o tipo de cabelo, o formato do nariz e da boca e a cor da pele. Assim, a banca busca compreender como a sociedade enxerga esse candidato, e se ele integra o público-alvo da política de ações afirmativas, ou seja, pessoas negras, sejam elas de cor preta ou parda.
Todos os candidatos têm o direito, caso sejam indeferidos na primeira banca, de serem avaliados por uma segunda, composta de cinco avaliadores que não participaram da primeira análise. Essa segunda banca, chamada de Recursal, proporciona a ampla defesa e o exercício do contraditório. A banca recursal não avalia fotos de familiares ou mesmo dos candidatos, realizando novamente uma avaliação do conjunto das características fenotípicas dos candidatos. Caso não concordem com as avaliações realizadas pelas bancas, os candidatos são informados de que têm o direito de contestar o resultado na Justiça.
Nos últimos anos temos recebido algumas demandas judiciais de candidatos indeferidos pela banca de heteroidentificação. Em todos esses casos, a Procuradoria Jurídica responde em juízo apresentando os detalhes do procedimento e as justificativas de indeferimento. Na maior parte dos casos, de posse das respostas da UFMG, a justiça tem mantido as decisões da Universidade. Entretanto não temos, no momento, estatísticas precisas sobre o percentual de decisões favoráveis a estudantes na Justiça."