A compulsão alimentar é um dos distúrbios mais comuns e ao mesmo tempo mais negligenciados na sociedade atual. Afeta pessoas de diferentes idades, perfis e condições físicas. E, ao contrário do que muitos pensam, não está ligada apenas à fome — mas a um ciclo de impulsos, arrependimento, ansiedade e falta de controle. Para muitos, comer compulsivamente é uma tentativa de anestesiar emoções que não se consegue lidar de forma racional.
Em uma de suas publicações no Instagram, o médico Paulo Muzy (CRM – 115.573) fez um alerta direto: é possível romper esse ciclo com um comportamento simples, mas que exige consistência. Segundo ele, não se trata de cortar alimentos, fazer dietas restritivas ou seguir fórmulas mirabolantes, mas sim de desenvolver uma atitude estratégica que bloqueia o gatilho da compulsão.
O médico — que frequentemente aborda temas de saúde comportamental, performance e nutrição — reforça que a chave para vencer a compulsão está menos na emoção e mais na ação racional e disciplinada. Em vez de lutar contra o impulso, a proposta é adotar comportamentos que cortem a repetição automática que o cérebro está condicionado a seguir.
O que é compulsão alimentar e por que ela vai além da “fome”
A compulsão alimentar é caracterizada por episódios recorrentes em que a pessoa consome uma quantidade exagerada de comida, geralmente de forma rápida e sem sentir fome real. O mais comum é que esses episódios ocorram em momentos de tensão emocional, solidão, estresse ou frustração. Após o episódio, é frequente o sentimento de culpa, angústia e vergonha.
De acordo com a Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO), cerca de 35% das pessoas com sobrepeso relatam episódios frequentes de compulsão alimentar. Em muitos casos, essa compulsão está associada a quadros de ansiedade, depressão ou histórico de dietas extremamente restritivas.
A compulsão pode se manifestar com diferentes alimentos, mas os mais comuns são doces, massas, alimentos ultraprocessados e com alto teor de gordura e sal. Isso porque o cérebro associa esses alimentos ao prazer imediato, ativando áreas semelhantes às que respondem a drogas e outras dependências.
O comportamento indicado por Paulo Muzy e por que ele funciona
No vídeo, Dr. Paulo Muzy defende que o comportamento que muda tudo na compulsão alimentar é a antecipação consciente. Ou seja: não esperar o impulso surgir para decidir o que fazer, mas sim já ter pré-definido o que será feito naquele momento de vulnerabilidade.
Exemplo prático: se a pessoa sabe que tende a ter crises de compulsão à noite, após um dia estressante, ela deve previamente:
- Preparar uma refeição saciante e equilibrada
- Definir que não abrirá aplicativos de delivery naquele horário
- Ter opções seguras e controladas ao alcance
- Evitar ambientes e estímulos que favorecem o gatilho (como sofá + TV + celular + estresse)
Segundo Muzy, a chave não está em “vencer a vontade”, mas em não abrir espaço para que ela comande a ação. Isso é feito por meio de decisões tomadas antes do impulso — e repetidas com consistência.
Esse conceito está alinhado com a teoria do planejamento de contingência, bastante usada na psicologia comportamental. Ela defende que a previsibilidade e antecipação de resposta são muito mais eficazes do que o “controle na hora”, que falha diante de impulsos fortes.
Estratégias comportamentais para reduzir a compulsão alimentar
Para além do comportamento central proposto, especialistas em nutrição e psiquiatria clínica listam estratégias complementares que podem ajudar a diminuir os episódios compulsivos:
1. Planejamento das refeições
Ter refeições previamente organizadas ajuda a reduzir a ansiedade diante do “o que vou comer”. Isso diminui a chance de decisões impulsivas com base em fome extrema ou desequilíbrio emocional.
2. Sono de qualidade
De acordo com a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), a privação de sono eleva os níveis de grelina (hormônio da fome) e reduz a leptina (saciedade), favorecendo a compulsão por alimentos calóricos.
3. Atividade física regular
Exercícios liberam endorfinas, serotonina e dopamina — neurotransmissores que reduzem a ansiedade e melhoram o humor. Isso pode funcionar como uma válvula de escape natural para quem sofre com alimentação emocional.
4. Acompanhamento psicológico e nutricional
Psicólogos especializados em transtornos alimentares e nutricionistas comportamentais trabalham com técnicas como TCC (terapia cognitivo-comportamental), mindfull eating e reeducação alimentar — focando em restaurar a relação emocional com a comida.
5. Redução de gatilhos ambientais
Evitar exposição a alimentos que desencadeiam a compulsão, manter a casa livre de opções ultraprocessadas e cortar estímulos como TV e celular durante as refeições ajudam no controle consciente.
Quando procurar ajuda médica
A compulsão alimentar não é falta de força de vontade — e deve ser tratada como uma condição de saúde. Quando os episódios se tornam frequentes, trazem prejuízo à saúde física e causam sofrimento emocional, é importante buscar ajuda profissional.
De acordo com o Ministério da Saúde, os transtornos alimentares fazem parte das condições que devem ser acompanhadas pela atenção primária e pelas redes de atenção psicossocial (RAPS). O tratamento envolve abordagem multidisciplinar, com foco em saúde física, mental e social.
A identificação precoce e a abordagem correta evitam que a compulsão evolua para quadros mais graves, como o transtorno de compulsão alimentar periódica (TCAP), bulimia nervosa ou obesidade associada a transtornos emocionais.