Um mergulho no subterrâneo da produção de ouro em Sabará
Reportagem do EM desce na Mina Cuiabá, da AngloGold Ashanti, e entra nas galerias que chegam a 1.600 metros abaixo da terra
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Siga noLocalizada no município de Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), a Mina Cuiabá, da AngloGold Ashanti, extrai ouro desde 1984. Hoje, suas galerias chegam a 1.600 metros abaixo da terra, o que torna o seu último nível o ponto mais baixo que se pode atingir no país, abaixo do nível do mar.
De acordo com Othon Maia, vice-presidente de Sustentabilidade e Assuntos corporativos da empresa, as pesquisas de prospecção detectaram a presença do metal até os 2.400 metros de profundidade, se aproximando, inversamente, do ponto mais alto de Minas Gerais, terceiro extremo do país, o Pico da Bandeira, com 2.900 metros de altitude.
A reportagem do Estado de Minas “mergulhou” até o nível 11 da Mina Cuiabá, a cerca de 900 metros de profundidade, o ponto máximo que se pode alcançar usando o elevador, uma “gaiola” de dois andares capaz de transportar cerca de 50 pessoas por vez. O “eio” dura cerca de quatro minutos.
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O transporte dos funcionários de um turno completo, aproximadamente 480 pessoas, dura até 1h30. Se Sabará está localizada a aproximadamente 700 metros acima do mar, é bem provável que o nível 11 esteja abaixo do mar. Além do elevador, é possível ar o interior da mina a bordo de algum veículo, em uma rede de túneis com nada menos que 330 quilômetros de extensão.
O protocolo de segurança para ter o a um ambiente como esse vai além dos óculos de proteção, capacete com lanterna, colete com faixa refletiva, botas, máscara com filtro e a imagem de Santa Bárbara que decora o nível 11. No cinto é preciso prender um pesado estojo contendo uma máscara de emergência, capaz de, por meio de uma reação química, gerar oxigênio suficiente para 30 minutos, pensada principalmente para incêndio.
Othon Maia garante que nunca foi preciso colocar em uso uma dessas máscaras na mina. O local também conta com várias câmaras de refúgio, devidamente paramentadas para dar e para os funcionários aguardarem o resgate em caso de acidente.
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Outro item que todos os que entram na Mina Cuiabá devem portar é o People Tracking, sistema que informa em tempo real ao Centro de Controle de Operações (o cérebro da operação, onde todas as decisões são tomadas) onde está cada pessoa. Antes dele, para fazer uma detonação para abrir galerias na mina, o levantamento dos funcionários era feito por um método que usava o quadro de crachás. No entanto, esse controle era ível de erro, além de não informar a localização do funcionário.
Uma novidade na segurança do trabalho é uma sala dedicada a treinamentos de realidade virtual, para que os funcionários possam vivenciar situações de forma imersiva. Desde 2022, as barragens da AngloGold não recebem mais rejeito em polpa, devido a implantação do processo de disposição de rejeito a seco em todas as unidades do Brasil.
Uso sustentável de recursos
A infraestrutura na mina também é surpreendente e colossal. Para começar, só é possível ficar em profundidades tão elevadas sem “morrer assado” graças ao sistema de ventilação. De acordo com Luis Lima, vice-presidente das Operações Cuiabá da AngloGold Ashanti, a planta de ventilação tem o tamanho de um andar do BH Shopping e injeta ar resfriado a uma temperatura aproximada de 2 graus, sendo que no final dos túneis a temperatura é de cerca de 24 graus.
Para poupar energia elétrica e tornar a operação mais sustentável, essa ventilação é fornecida por demanda por meio de uma gestão autônoma, capaz de identificar quantos funcionários estão em cada ponto da mina. Nos pontos em que não existem funcionários a ventilação é desligada. Esse cuidado reduziu o consumo de energia em 7%.
Outro bom exemplo de sustentabilidade é o manejo da água usada nas operações de perfuração para resfriar as brocas. A operação é autossuficiente em água, ou seja, não precisa receber água de fora, bastando usar e reutilizar a água interna. Existe até uma estação de clareamento da água, que separa o sólido do líquido, no nível 17, a 1.100 metros de profundidade. A geração de água é de 190 mil litros por hora.
Toda operação é comandada por centros de controle nas próprias galerias e na superfície
Descarbonização
A AngloGold faz parte do pacto global pela descarbonização, e tem o compromisso de zerar suas emissões de carbono até 2050. Toda a energia elétrica consumida pela empresa já é zero carbono. Hoje, o trabalho é feito para mitigar as emissões dos combustíveis fósseis. O compromisso inicial era reduzir 30% das emissões de carbono até 2030, meta que já foi superada além do dobro, tendo chegado a 63%.
Uma das aquisições que contribuíram com isso foi a escavadeira elétrica. O equipamento possui três baterias, uma em uso, outra recarregando e outra em processo de resfriamento (necessária após a recarga). A estação de carregamento foi construída no nível 22. O processo de troca da bateria dura apenas cinco minutos, feita com o auxílio de outra carregadeira. Esse método permite um ganho em produtividade, já que a máquina não precisa ficar parada para recarregar a bateria. A intenção é comprar novas máquinas elétricas, tendência seguida pela aquisição de caminhões elétricos.
Uma iniciativa que contribuiu muito para descarbonizar os processos na Mina Cuiabá foi tomada nos anos 1980, no início da operação. São os teleféricos que levam parte da produção para ser beneficiada na Planta Queiroz, em Nova Lima (na RMBH), solução que evitou incontáveis viagens de caminhão. A Mina Cuiabá também usa escavadeiras operadas remotamente a partir da superfície, porém, esses equipamentos são movidos a diesel. Outros equipamentos estacionários também são operados remotamente.
Uma cidade debaixo da terra
Uma visão 3D das galerias revela que a mina parece um formigueiro. São 330 km de túneis. Para se ter ideia, para chegar ao último nível a partir do shaft, no nível 11, são gastos 25 minutos de carro. “Um dos maiores detratores da nossa produtividade é o deslocamento no subsolo”, disse Luis Lima. Por isso, a Mina Cuiabá conta com várias estruturas para evitar os deslocamentos até a superfície, como um “posto de combustível” no nível 11, abastecido por uma tubulação, que mantém quantidade de diesel operacional para o dia lá embaixo.
No interior da mina circulam 74 equipamentos pesados, cerca de 100 picapes médias e 40 caminhões de e. Por isso, no nível 11 também funciona uma oficina, para as manutenções preditivas, preventivas e corretivas. Como a mina tem 54 subestações, lá também funciona uma oficina elétrica, para fazer todas as manutenções. O interior da mina ainda conta com uma fábrica de concreto e laboratórios de mecânica de rocha, para aferir a qualidade do concreto aplicado nos túneis.
Quase toda a extensão da mina está coberta por rede wi-fi dedicadas aos equipamentos e a outras ações. São 444 roteadores espalhados pelo subsolo. Para cobrir todos os pontos da mina eles estudam implementar uma fibra óptica que não é inteiriça, capaz de transmitir o sinal para 100% das galerias. Mas, se isso falhar, existem sistemas de telefonia, rádio e de comunicação por código morse disponíveis.
A partir de 2023 a AngloGold começou a desenvolver um trabalho de diversidade dentro de seu seu quadro de funcionários. Em um ano, o percentual de mulheres que trabalhavam na Mina Cuiabá saltou de 6% para 14%, o que representa cerca de 180 novas funcionárias, sendo que 80% delas foram trabalhar no subsolo. Para dar e a essas funcionárias, no nível 11 foi montado o Espaço Mulher.
Operários contam com todo o e para permanecer embaixo da terra para trabalhar
Produção no primeiro trimestre
De janeiro a março deste ano a AngloGold Ashanti produziu 68 mil onças (1.928 kg) de ouro no país. As operações da Mina Cuiabá foram responsáveis por 58 mil onças (1.644 kg), enquanto as Operações Serra Grande, em Crixás (GO), foram responsáveis por 10 mil onças (283 kg). Na América do Sul ainda existe a Operação Cerro Vanguardia, na Província de Santa Cruz, na Argentina, que produziu 47 mil onças (1.332 kg).
Em todas as suas operações no mundo - a AngloGold Ashanti tem sede em Londres, no Reino Unido, e atua em nove países, na África, América do Sul, América do Norte e Austrália -, a empresa produziu 720 mil onças (20.412 kg) do metal no primeiro trimestre de 2025. Nesse período, o fluxo de caixa livre das operações globais da mineradora aumentou sete vezes. A companhia gerou US$ 403 milhões em fluxo de caixa livre no 1º trimestre de 2025, representando um aumento de 607% em relação ao ano anterior, quando foram registrados US$ 57 milhões no mesmo período.
O Ebitda Ajustado - lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização - aumentou 158% em relação ao ano anterior, atingindo US$ 1,12 bilhão no primeiro trimestre de 2025, frente aos US$ 434 milhões do mesmo período de 2024. O resultado foi impulsionado por volumes de produção maiores, gestão eficaz de custos e um preço médio de ouro recebido por onça mais alto.
Segundo o CEO global da AngloGold Ashanti, Alberto Calderon, este é um início de ano muito forte, especialmente nas operações gerenciadas. “Observamos um forte crescimento na produção com a adição da Sukari, no Egito. Nossos esforços de controle de custos continuam a compensar os efeitos da inflação, o que nos permitiu aproveitar o aumento no preço do ouro”, revela Calderon.
Prêmio
As Operações Cuiabá receberam o Global Safety Award 2024, troféu concedido às unidades que se destacam em segurança em todo o grupo AngloGold Ashanti. O prêmio é resultado de melhorias significativas nos indicadores da operação, como a redução de 48,88% na taxa de frequência de acidentes.
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Outro avanço importante em Minas Gerais foi a aprovação, pela Agência Nacional de Mineração (ANM), do Plano de Fechamento das minas Velha e Grande, que operaram em Nova Lima entre 1834 e 2003. A decisão vai viabilizar a implementação do projeto Nova Vila, que busca transformar a área das antigas minas em um espaço sustentável.
O projeto prevê a criação de centros culturais, áreas verdes, moradias e infraestrutura, com a preservação do patrimônio histórico e ambiental da região. O plano de fechamento também já havia recebido aval da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) em 2024.