Qual é o efeito do Oscar na carreira dos artistas e dos filmes?
Impacto de vencer o prêmio mais cobiçado do cinema varia para produções e artistas. No caso de "Ainda estou aqui", deve projetar o longa em outros mercados
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Um Oscar muda uma carreira? Sim, certamente. Porém, a resposta é diferente para filmes, atores e atrizes, a ponta mais visível da máquina em torno da premiação mais importante da indústria cinematográfica.
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Essa mudança, vale reforçar, nem sempre é positiva, conforme os 97 anos de história da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas estão aí para provar.
Mais relevante do que a estatueta em si são as indicações, que fazem a diferença para a bilheteria de uma produção, em especial para aquelas nomeadas na categoria principal, a de Melhor Filme. Assim que a lista é anunciada, os concorrentes têm o circuito de salas expandido. Isto, logicamente, poderá reverter em aumento significativo de espectadores.
“Ainda estou aqui” estreou em 7 de novembro no Brasil, em cerca de 600 salas. Hoje, 17 semanas mais tarde e 5,3 milhões de espectadores depois, segue em cartaz em mais de 700. Pelo menos 2,3 milhões de espectadores assistiram ao filme neste ano, quando a campanha do Oscar estava a pleno vapor. Um grande estímulo ocorreu no início de 2025, quando Fernanda Torres venceu o Globo de Ouro de Melhor Atriz.
Boa parte da bilheteria do filme veio na esteira das indicações (que ocorreram poucas semanas após a consagração de Fernanda no Globo de Ouro), e não do Oscar propriamente dito. O prêmio da Academia consagra carreiras e encerra a temporada de premiações. Desta maneira, as coisas costumam ocorrer antes da cerimônia em si.
Mas, logicamente, há terrenos a serem explorados com um Oscar em mãos. No mundo (estreou em 32 países, além do Brasil), “Ainda estou aqui” já fez US$ 30 milhões (cerca de R$ 176 milhões), segundo o site Mojo Box Office.
Chegada ao streaming
Com toda a repercussão do Oscar de Melhor Filme Internacional, o primeiro do Brasil, o filme continuará sua carreira ao longo deste mês. Mas a chegada em breve ao streaming (“Ainda estou aqui” estreia em 6 de abril no Globoplay) poderá fazer com que a força nas salas arrefeça gradativamente.
Um caso emblemático do fator indicação ao Oscar para a bilheteria de um filme é de 2000, ou seja, antes do streaming (o que era o cenário ideal para produções feitas para o cinema). Após a indicação em oito categorias do Oscar (cinco das quais acabou vencendo), “Beleza americana” (1999), de Sam Mendes, aumentou em 43% sua bilheteria. Isto somente nos EUA.
Com os atores e atrizes, o impacto de um Oscar se reflete não em bilheteria diretamente, mas na continuidade e relevância da carreira. Claro que existem os hors-concours. Mas um Oscar está longe de ser uma garantia de sucesso. Para cada Meryl Streep ou Daniel Day-Lewis, há um vencedor da estatueta de quem pouco se ouve falar.
O italiano Roberto Benigni, por exemplo. Em 1999 ele se tornou o “algoz” de “Central do Brasil”, primeira indicação de Walter Salles ao Oscar de Filme Internacional. Benigni, que dirigiu “A vida é bela”, também recebeu naquele ano a estatueta de Melhor Ator. Não teve nenhuma atuação relevante desde então.
Nicolas Cage é um case em Hollywood de má gestão de carreira. Recebeu o Oscar de Melhor Ator em 1996 por “Despedida em Las Vegas” e, desde então, emenda um projeto atrás do outro. Todos absolutamente comerciais, sem nenhum prestígio cinematográfico. Até os dias de hoje, a única negra a vencer o Oscar de Atriz (principal), Halle Berry, depois do prêmio por “A última ceia” (2002), vem somando momentos de pouca expressão no cinema.
Marion Cotillard (Melhor Atriz por “Piaf – Um hino ao amor”, em 2008) e Cate Blanchett (oito indicações, duas delas que resultaram em Oscars) são bons exemplos de atrizes que conseguiram se manter bastante produtivas e relevantes após receber o prêmio. Já Hilary Swank, também detentora de dois Oscars (o mais recente deles há 20 anos, por “Menina de ouro”), hoje está longe da Lista A de Hollywood.
Um caso interessante é o de Anne Hathaway. Em 2013, a atriz levou a estatueta de Melhor Atriz Coadjuvante por “Os miseráveis”. O prêmio foi uma das surpresas naquele ano. Sua atuação foi muito criticada – muitos a consideravam artificial demais. Surpreendida mesmo ficou a atriz quando, ao fazer uma busca no Google pelo próprio nome, se deparou com a seguinte pesquisa: “Por que todo mundo odeia Anne Hathaway?”.
Esta história foi relatada pela atriz à “Vanity Fair”, em 2024. “Muitas pessoas não me ofereciam papéis porque estavam muito preocupadas com o quão tóxica minha imagem havia se tornado on-line”, disse Anne Hathaway. Quem a “salvou”, segundo ela, foi Christopher Nolan, quando a escalou para o sucesso “Interestelar”.
Fernanda Torres não levou o Oscar, mas sua trajetória, mais do que estabelecida, sofreu um enorme desvio nos últimos seis meses. É cedo para dizer se toda a repercussão, aqui e lá fora, diante de sua candidatura, vai resultar em produções relevantes. Caso ela faça escolhas com a segurança que apresentou ao longo da campanha pelo Oscar, “Ainda estou aqui” terá representado um primeiro capítulo de uma nova temporada.