
"Emilia Pérez" estreia com protagonista cancelada e alvo de críticas
Filme líder em indicações ao Oscar chega às salas nesta quinta (6/2), em meio à polêmica provocada por tuítes de teor racista e xenofóbico da atriz principal
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“Emilia Pérez” chega nesta quinta-feira (6/2) aos cinemas, no olho do furacão. “Montanha russa de emoções”, declarou, anteontem (4/2), Karla Sofía Gascón nas redes sociais, mesmo dia em que o portal “The Hollywood Reporter” publicou que a atriz espanhola foi excluída de eventos nos EUA em torno da campanha pelo Oscar.
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Nesta semana, a intérprete da personagem-título também foi removida da campanha publicitária do filme, como mostrou postagem no X (ex-Twitter) do roteirista Sam Herbst com o novo cartaz da Netflix, que distribui o longa nos EUA, Canadá e Reino Unido.
“Querem me aplicar a cultura do cancelamento”, Karla escreveu, dizendo ter sido “transparente, porque não tenho nada a esconder”. Publicações racistas e xenofóbicas da atriz, em 2020 e 2021, no X, vieram à tona recentemente.
Afirmações em torno de uma possível campanha difamatória contra ela criada por “pessoas que trabalham no ambiente de Fernanda Torres” tinham vindo antes de o caldo entornar com o imbróglio do ex-Twitter, cuja conta Karla excluiu. A espanhola e a brasileira estão indicadas ao Oscar de Melhor Atriz.
Votação
A cerimônia de entrega das estatuetas será em 2 de março. A votação dos membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas vai da próxima terça (11/2) até 18 deste mês. Ao longo de fevereiro, muita coisa pode acontecer, mas é difícil pensar em um cenário em que “Emilia Pérez” triunfe como triunfou no Festival de Cannes (Prêmio do Júri e o prêmio conjunto de atuação para o elenco feminino) e no Globo de Ouro (quatro troféus).
Mesmo fazendo história – é a primeira produção não-americana a ser indicada a 13 categorias do Oscar; Karla é a primeira atriz trans a receber uma nomeação – “Emilia Pérez” chega machucado na reta final da disputa.
Mesmo antes da confusão em torno da protagonista, o filme de Jacques Audiard vinha sofrendo críticas – pelo elenco majoritariamente não mexicano, pelo uso de IA para afinar a voz de Karla, pela falta de autenticidade, por fazer um musical em torno de um tema gravíssimo no México, como é o desaparecimento de milhares de pessoas .
O público pode assistir a “Emilia Pérez” pensando em toda a problemática ou chegar ao cinema única e exclusivamente para ver o filme – um exercício e tanto de sublimação.
Como cinema, é uma montanha-russa daquelas, bem diferente da que Karla está vivendo. Uma história absurda contada de forma delirante que se torna fascinante justamente por essas razões. Audiard é chamado de o “Scorsese francês”, com filmes que defendem outsiders e gângsteres carismáticos. Faz sucesso de público e de crítica.
O ponto de partida de “Emilia Pérez” não tem nada a ver com o México. Audiard se baseou em agens de “Écoute”, segundo romance do escritor francês Boris Razon, que trata da busca por identidade em uma sociedade hipervigilante.
Zoe Saldaña é quem dá início à história. Ela é Rita, personagem que abre o filme, com uma extravagante sequência musical. “Emilia Pérez”, por sinal, é diametralmente oposto a todas as produções que tomam o formato Broadway como referência.
Não há nenhuma canção daquelas que continuam com o espectador assim que o filme termina. São performances ora enérgicas, ora discretas, ora estranhas – um número é em torno de uma vaginoplastia. Há vezes em que os personagens quase recitam suas falas.
A advogada Rita está farta de defender homens culpados por crimes contra mulheres. Mas ela não tem crise de consciência alguma quando um chefão do narcotráfico lhe promete mundos de dinheiro, caso ela trabalhe para ele.
Narcotraficante
Esse homem é Manitas Del Monte (Karla, irreconhecível), um temido narcotraficante que explora a violência de todas as maneiras. Só que Manitas nasceu no corpo errado. Decide fazer uma cirurgia de afirmação de gênero. Como mulher, deixará a cultura machista do cartel. Deixará também sua família, a mulher Jessi (Selena Gomez) e os dois filhos, que deverão morar na Suíça depois de sua “morte”.
Rita resolve tudo: cirurgião, desaparecimento de Manitas, futuro da família. Alguns anos se am, e a advogada reencontra a cliente, na verdade Emilia Pérez, em Londres. As duas se unem e, no retorno ao México, criam uma organização sem fins lucrativos que ajuda famílias a procurar parentes desaparecidos.
A parte inicial de “Emilia Pérez” é levada em ritmo de thriller; já a segunda metade resvala para o melodrama. Há sequências muito divertidas em toda a trama. O que torna tudo mais interessante é a mistura bizarra de elementos – e as interpretações em ponto de ebulição de Karla, Zoe e Selena, esta no papel de uma esposa-troféu que, depois de anos de apagamento, conseguiu sua libertação (o sotaque desta última, que não é fluente em espanhol, é para lá de estranho).
Não há como negar que, em seu apelo kitsch, “Emilia Pérez” não deixa que o espectador saia do cinema indiferente. Se as reações serão positivas ou negativas, isto caberá a cada um.
Tragédia mexicana
Desde 1961, uma base nacional de dados apura desaparecimentos decorrentes da violência do narcotráfico no México. O número atualizado é de 110 mil pessoas. A grande crítica que se pode fazer a “Emilia Pérez” é o fato de tornar trivial o maior drama mexicano. A despeito das outras polêmicas em torno da produção, esse é um aspecto polarizante em relação a um filme como nenhum outro.
“EMILIA PÉREZ”
(França/México/Bélgica, 2024, 132min.) Direção: Jacques Audiard. Com Karla Sofía Gascón, Zoe Saldaña e Selena Gomez. O filme estreia nesta quinta-feira (6/2), nos cines BH 10 (16h20, 19h15, 22h10); Boulevard 5 (18h20, 21h); Centro Cultural Unimed-BH Minas 2 (20h40); Del Rey 2 (21h); Diamond 3 (14h30, 17h30, 21h); Pátio 5 (11h10, sáb e dom.; 14h20, 17h20 e 20h20); Ponteio 4 (15h50, 21h10); UNA Cine Belas Artes 1 (15h30, 20h30).