

Um crescimento exótico
Temos crescido desde 2021 a uma média de 3% ao ano e há projeções indicando que de 2024 a 2026 vamos continuar crescendo em torno desta média
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O Brasil sempre foi um país difícil de ser interpretado e compreendido. Em todos os aspectos da vida, as teorias universais sempre precisaram de uma certa tropicalização antes de serem aplicadas com proveito aos nossos grandes problemas.
Vejam o exemplo da nossa vitória sobre a inflação. A arquitetura do Plano Real não foi inspirada em nenhum dos modelos correntes à época. Foi uma invenção inteiramente nova e brasileira. Depois dele, a compreensão da inflação nunca mais foi a mesma. Enquanto insistimos nos modelos ortodoxos, ditados nas grandes universidades americanas só conhecemos fracassos.
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Agora mesmo estamos nos defrontando com seguidas surpresas com o crescimento da economia. Desde o fim da pandemia, as previsões dos especialistas do mercado financeiro e da maioria das consultorias para o crescimento do PIB tem sido sistematicamente ultraadas. O nosso país parece que está vivendo um ciclo de crescimento relativamente alto em relação ao mundo, contrariando a sabedoria convencional. Nossa população parou de crescer e perdemos o chamado bônus demográfico, a partir do qual o crescimento depende exclusivamente do aumento da produtividade. A produtividade, por sua vez, depende do aumento dos investimentos, o que definitivamente não está ocorrendo no Brasil.
Sempre dizem que nosso ambiente de negócios não favorece o investimento privado e o investimento público está fora de cogitação por causa da má situação fiscal. Portando, não podemos crescer.
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No entanto, temos crescido desde 2021 a uma média de 3% ao ano e há projeções indicando que de 2024 a 2026 vamos continuar crescendo em torno desta média, mesmo com os juros básicos por volta de 7% em termos reais, coisa incompreensível para qualquer estrangeiro. Com esta política monetária qualquer país do mundo estaria imerso numa grande recessão. Dois textos que pude ler esta semana me ajudaram a esclarecer a questão. Um deles foi um trabalho do Poder 360, do excelente jornalista Fernando Rodrigues e outro foi um artigo no jornal Valor, dos economistas Ricardo Barboza e Bráulio Borges.
No trabalho do Poder 360 tomamos conhecimento do tamanho e da evolução recente dos programas federais de transferência de renda. Em 2024 o valor destas transferências vai alcançar 397 bilhões de reais, basicamente com o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada. Em 2004 este valor não ava de 10 bilhões. Enquanto a inflação neste período foi de 193%, os programas foram multiplicados por 40 vezes. O número de beneficiados e o valor dos benefícios foram substancialmente elevados em 2022, durante as eleições, por iniciativa do governo Bolsonaro e o apoio integral dos políticos de esquerda. O tamanho desses programas, a que se deve adicionar o volume de gastos com as aposentadorias rurais, não contributivas, que vão custar este ano 194 bilhões, praticamente esgota a capacidade fiscal do Estado brasileiro. Cerca de 80 milhões de brasileiros, 40% da população está sob a proteção dessas transferências.
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O artigo do “Valor” explica que a política fiscal depois da pandemia mudou sua postura, pisando no acelerador e aumentando as transferências sociais em relação a outras despesas. Estas transferências diretas têm um efeito multiplicador na economia muito maior que o de outros tipos de despesa. Gastando mais e alocando mais recursos para essas transferências, a política fiscal acaba exercendo um forte impulso no PIB, contrabalançando os efeitos contracionistas da política monetária.
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Parece que estamos crescendo e, ao mesmo tempo, diminuindo a pobreza, sem muito esforço. Só que milagres são raros. Ao contrário do Plano Real, esta trajetória não é sustentável. O Estado brasileiro está no limite de sua capacidade fiscal e o parque produtivo, para atender o consumo, precisa de novos investimentos. Daqui para a frente não há outra escolha, para tristeza dos populistas da direita e da esquerda. Só o investimento, a inovação e o aumento da produtividade podem garantir um crescimento que dure mais do que uns poucos anos. Somos diferentes, mas nem tanto!
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.